terça-feira, 29 de outubro de 2013

Capta.Lirismo

Eu sou o senhor de tudo, manifestador do caos e proclamador de ilusões. Eu criei seus medos e logo em seguida vendi soluções. Eu te dei uma vida manipulada, afogada em valores vazios, mas que você daria tudo para que todos olhassem para o buraco em sua cabeça e aplaudisse esse circo monstruoso... plateia de porcos!

Eu encho o seu rabo de comida durante 24 horas; excluo, mutilo e deixo passar fome qualquer classe imunda e que apenas ocupa lugar nesse precioso mundo. Tudo isso faço para o teu bem-estar. Transformo-me em futilidades para te fazer sorrir; e não te preocupes, não precisa forçar um pensamento grandioso, já faço isso por ti.

A única coisa que te peço é que me use, viva de meu sangue e vista-se de meu corpo; utilize minha língua para proclamar comandos, infle meus pulmões de sua preciosa nicotina e use meus pés para pisar na escória. Use-me, use-me, estimule o crescimento; cresça e eu crescerei com você. Mas não ouse me abandonar nem se quer por um segundo, pois sem mim tu não és nada. Sem mim não passarás de um pobre lavrador, porteiro, vigia... morto de fome.

Eis o meu ponto: preferes ser um morto de fome ou um vazio vivo?

Lembre-se que eu sou a espada ou a cruz, a salvação ou a redenção, o consumo ou a morte, o dogma e ilusão; eu sou o Messias... ou o nada.


(sou o que todos são por dentro).

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Oceano

Foi no meio do oceano que me encontrei. A cada onda, cada brisa, me modifiquei. Em seu tênue e constante fluxo, fui arremessado às pedras: fui dilacerado, morto por corvos. Um corpo jogado a beira de uma costa, apreciado por navegantes e motivo de choro de [turistas que por lá passavam] pequenos anjos. Na areia da praia me tornei pó. Já não sabia onde o pó (pequenas lembranças de meu antigo corpo, começavam) e onde a areia (árdua e áspera, assim como minhas lembranças) terminava. Foi a onda, brilhante e generosa onda, a quem devo minha vida (ou os resíduos dela), ela jogou seu pesado e gélido braço sobre mim, me puxou, me fisgou e jogou-me novamente no conturbado (ora calmo) oceano. Nesse momento tudo girou: céu azul e o infinito enceno tornaram-se apenas um; já não sabia se os seres brilhantes na água eram as estrelas que permeavam os céus, ou se a linda lua se tornara a pobre Virginia, que agora chora. Então tudo para, tudo fica inerte por todo o sempre, mas não definitivamente, afinal o oceano também existe nesse meio contraditório. E o som se instala. O transbordar retorna. E no fim, me rendo ao oceano e me deixo afogar.

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Pessoas são Máscaras

Pessoas são máscaras. Pessoas fingem, iludem, seguem uma doutrina ou ideologia que não condiz com seu verdadeiro eu. Pessoas são espelhos encardidos, de onde não conseguimos ver seu real reflexo, ou melhor, seu interior. Pessoas são inspirações para outras. Mas qual das pessoas? A real, invisível e tímida de ser mostrada - afinal ninguém aceita a real condição que quebra como uma água, as tradições e farsas de uma sociedade idiota e burra -, ou a falsa, a que ilude, segue a brincadeira de fantoches manipulados, por assim ser a melhor opção, o mais fácil jeito de não se ferir, embora mate cade vez mais a verdadeira personalidade que tem dentro de si. Pessoas são idiotas, um oceano inteiro de culpa, onde se afogam e jamais consegue ver outra vez a costa. A verdade.

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

The Crow

O Corvo se instalou no meio do povo (ele está no meio de nós!). Usa, abusa e usurpa a alma (ele está no meio de nós!). Ele permeia a cabeça dos enfermos, se alimenta de sua ferida e medo e, com um súbito piscar de olhos, ele levanta voo (ele está no meio de nós!). Ele é a raiva que culmina no assassino, o frio que rodeia o sem esperanças; monta seu ninho na mente do insano e gralha, gralha alto, tão alto quando um coro gregoriano; tão alto quanto os sinos das igrejas e tão doce quanto o próprio paraíso.
Ele é o querubim caído. Com suas vestimentas negras, desceu. Uma queda tão teatral, tão insana que mais parecia a última gota de sangue do Criador, a última gota de vida... Que leva à morte. Mais uma vez ele levanta voo, se instala na igreja, engole a língua de cada criança, cada pequenino que cantava a música da salvação. Agora ele tem mil vozes em sua boca, mas nenhum ouvido disposto a ouvir a dor que culmina a alma dos que ainda as têm.

Por fim, o Corvo se cansa dessa brincadeira. Ele mata, um por um; arranca o coração dos inocentes e a cada batida, cada gongo de vida se esvaindo, é o corvo chegando. Ele finalmente vem, expurga, mutila, mata, mas prende a alma, para que assim possa repetir todo o processo. O céu escurece, os anjos choram, o corvo abra as asas – imensas sombras escuras abraçam os corpos... O beijo da morte foi dado –, depois levanta voo, parte desse lugar. Muitos o consideram um dom ou uma maldição, uma submissão ou redenção. Na verdade, o Corvo é a libertação.